Ela já o conhecia e o achava lindo. Não de beleza física. Mas de beleza de pessoa interessante, inteligente. E não sabia se ele sabia dela.
Uma manhã, o telefone tocou:
Ela: Oi...
Ele: Oi, quem fala...
Ela (sabia que aquele número era dele!): Sou eu, Clarissa...da universidade.
Ele: Ah, desculpe, estava limpando a agenda do meu telefone. Achei que fosse outra Clarissa. Você está bem?
Ela: Agora que sabes que esse número é meu vais apagar?
Ele: Não! Eu posso precisar...Bom, outra hora falamos. Tchau
O coração de Clarissa disparou. Uma alegria contagiante. Não era uma ligação errada, ela tinha certeza.
Naquela noite, ela viajaria a trabalho, chegou muito antes do horário de seu voo ao aeroporto, irritada. Foi confirmar seu voo e quando virou, deu de cara com Ele. Conversaram. Se despediram. Última chamada do voo dele.
Depois de 15 minutos, o telefone dela tocou:
Ela: Oi..
Ele: Meu voo está atrasado. Não queros vir para cá comigo?
Ela correu até ele. Conversaram. Se olharam demoradamente. Estavam delizes com aquele encontro inesperado. Até que o voo iria partir.
Ele levantou e disse tchau. E se foi. Ela, inebriada por aquele inesperado encontro na madrugada.
Ele voltou, beijou seus lábios..."desculpe, não resisti!", ele disse.... E se foi.
O telefone dela tocou:
Ele: estou ligando so para dizer que dessa vez não teve problema, embarquei, estou dentro do avião..
Ela: que pena...
A madrugada ficou muito mais alegre....para os dois...
29 de março de 2011
8 de março de 2011
Mulheres: Liberdade!!!!
Assim eu vejo a vida
A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.
6 de março de 2011
"Tudo é questão de despertar sua alma"
Hoje, Gabriel García Marquez completa 83 anos de vida.
O mundo agradece a obra deste "eterno amante da palavra", não apenas pela sua produção literária, mas por sua vida, seu engajamento político e essa forma tão simples e apaixonante de descrever vidas e estórias do povo da América Latina.
Quando li "O amor nos tempos do cólera", senti a alma ser desperta para novas vivências. O livro todo é lindo, mas esses dois trechos, me traduzem toda em relação a esta obra.
"É incrível como se pode ser tão feliz durante tantos anos, no meio de tanto bate-boca, tantas chateações, porra, sem saber de verdade se isso é amor ou não."
"Nada nesse mundo é mais dificil que o amor"
Vida longa à Gabri García Marquez!!!
5 de março de 2011
Sobre lobos e meninos - Por Paulo Fonteles Filho
Uma página precisa ser aberta no contexto do debate acerca da Comissão da Verdade sob pena de mantermos uma visão parcial dos acontecimentos que envolveram nossos anos-de-chumbo, particularmente no Araguaia: o tratamento dado ao soldado brasileiro.
Aqui não falo de Bandeiras ou Moogs, Licíos ou Curiós, todos oficiais que atuaram como bestas-feras contra brasileiros, que na paisagem da invasão militar às matas do Pará sabemos com rigor documental terem agido com violência desmedida contra camponeses e guerrilheiros. Só não sabemos e precisamos saber é como os mandatários da caserna, em tempos de guerrilha na Amazônia, tratavam o mais modesto e popular de seus elementos, o próprio soldado. O soldado que é a razão de ser de qualquer Exército do mundo, da antiguidade até os dias atuais.
Faço esse aparte porque tudo pode faltar a uma força militar em combate, menos o soldado. Poderia haver, na Roma antiga, mil espadas, mas se não houvesse mil braços pretorianos a empunhá-las o contencioso estava decidido para a força oponente. Assim foi nos tempos de Júlio César e assim o é mesmo com as mais profissionais gendarmerias do século XXI.
O fato é que o grosso dos soldados que serviram o Exército para combater as Forças Guerrilheiras do Araguaia fora recrutada na própria região conflagrada.
Muitos deles tateavam o inicio do ciclo da vida adulta. Vinham das currutelas e grotas, muitos moravam em castanhais e mal sabiam escrever o nome, eram filhos das populações tradicionais ou de retirantes. Todos, sem exceção, filhos da tragédia brasileira, alargada pela visão de que os pobres eram um problema para a segurança nacional.
Contra estes meninos ouso dizer que os lobos bem-graduados transformaram-nos em seguras cobaias e promoveram um pérfido laboratório. Os métodos empregados contra camponeses e guerrilheiros foram cientificamente utilizados pelos “Doutores” (quem conhece a linguagem da repressão política sabe do que estou falando) junto aos recrutas.
Vamos a exemplos: alguém aí sabe o que é o Pau-do-Capitão? O Pau-do-Capitão é a versão recruta zero para a Cadeira-do-Dragão. O tal instrumento de tortura fora largamente utilizado contra os moços sob o sol escaldante da Amazônia matando os sonhos de servir a pátria. Alías, não apenas ao nobre sonho de defender com fervor seu país, mas qualquer outro sonho. Há ex-soldados, confesso, que não sonham há mais de trinta e cinco anos não porque torturaram, mas porque foram torturados.
Um caso diz respeito a um soldado que levava e trazia um preso para a sessão de tortura no 52 BIS em Marabá, em 1974. Durante dez dias os dois iam e vinham silenciosos, jamais trocaram uma palavra ou olhares. Em ambos a dualidade que envolve um vulcão e um funeral. Isto seria corriqueiro em tempos onde o aparelho estatal brasileiro estava vocacionado para a tortura se a questão não envolvesse pai e filho. Por dez dias o filho, soldado, levava e buscava, o pai, tido como subversivo, para as sessões de surra pedagógica. E todos no 52 BIS sabiam disso, todos sem exceção.
Quando ouvi aquele ex-soldado relatar tal história na frente de outros 50 ex-soldados senti todas as dores do mundo, suas crueldades e virtudes. Vejo aquele menino de 19 anos e 45 quilos, fardado, metralhadora em punho caminhando pelo calvário das gigantescas extensões daquele quartel. Penso em seu silêncio apenas rompido pelo passo do coturno e pelo sofrimento engolindo sangue do torturado, também silencioso. E assim iam pai e filho. E nestes mais de 35 anos só trocaram palavras apenas uma única vez, num velório em Belém do Pará.
Nunca mais vou esquecer essa imagem, não quero, não posso. Não é um direito que gozo sob pena de esquecer quem sou e de onde vim. Ao longo de 39 anos já vi e senti muitas coisas duras. Nasci numa prisão porque minha mãe fora presa grávida e barbaramente torturada comigo no ventre. Vi um pai assassinado pelas balas do latifúndio aos 15 anos de idade cujo organizador do crime, James Vita Lopes, atuou na Oban e SNI. Vi muitos companheiros perseguidos e mortos. Há muitos anos que meu couro endureceu e isso até tem me ajudado a continuar na luta e escrever este artigo nesta alta madrugada de segunda-feira em São Domingos do Araguaia. O fato é que aquele menino de 19 anos de 1974 quer falar e sua virtude, sua generosidade, é querer educar toda uma geração de outros meninos e isso será determinante para a felicidade espiritual do povo brasileiro. É por isso que a causa humana é inexorável tal qual a primavera do poeta comunista Pablo Neruda.
Mas outros pedem passagem e também querem falar e falar muito.
Um dos poucos soldados incorporados em Belém descreve a presença do DOI, cujos agentes chamavam de “Chefe” para o então Capitão Luchini. Queria ser barbeiro, aprender uma profissão, mas começou a se decepcionar quando um colega, também soldado, que prestava a guarda de um Osvaldão já morto foi levado para servir de relaxamento para os pára-quedistas oriundos do Rio de Janeiro, tropa de elite decisiva para debelar o movimento insurgente do Araguaia.
O aperitivo de entrada para a paranóica festa realizada quando do tombamento do comandante negro das matas foi dar choques e pancadas nos testículos do amigo daquele que ora narramos.
A ilusão com o quartel e com as tesouras encerrou-se, em definitivo, quando um Coronel, oficial do Estado-Maior, requisitou-lhe a ir até a residência para cortar o cabelo. Ao final do trabalho tal Coronel chama-lhe ao banheiro para ver como havia ficado o corte e o soldado-barbeiro se vê obrigado a manter relações sexuais com o oficial. Se aquele moço não trava a luta teria sido estuprado em plena Vila Militar.
Há um amontoado de nomes covardes na memória daqueles ex-meninos e os mais citados são sempre os Sargentos Anselmo, Hélio e Trajano e o Tenente Elton. Se o Tenente obrigava-os a tomar sangue de boi, o Sargento Trajano é o mais detestado.
Não era apenas detestado pelos maus-tratos dados aos subordinados, mas, sobretudo porque quando entrava na mata, em operações que chegavam a durar 15 dias ininterruptos revelava desmedida covardia e literalmente cagava nas calças de medo de guerrilheiro. Tal pavor fez com que obrigasse uma tropa toda de 14 homens fuzilar 3 castanheiros que saíam do banho de igarapé num final de tarde num mês perdido de 1974 num ponto remoto, de mata fechada em São João do Araguaia/Pa. Dezenas de camponeses, relatam, foram mortos desta maneira e outras dezenas sob tortura, não importava se em ambientes militares ou na mata fechada.
Mas não encerro por aí com o Sargento Trajano.
Depois de ver três castanheiros mortos, o antes covarde e guerrilheirofóbico Sargento Trajano retoma com suas vestes de brutamontes dos tempos de instrução no 52 BIS, quando poderia ser percebido pelo Estado-Maior como o mais abnegado dos patriotas.
Tal transformação foi tão imediata como o cheiro de pólvora depois de uma rajada de metralha. Agora novamente o Trajano era o machão. E logo a tropa encontrou com as famílias e colegas de trabalho dos que lá atrás foram deixados insepultos.
Segundo o relato que colhi, as mulheres velhas e novas tremiam, e os homens, velhos e novos, estavam todos urinados. As crianças choravam muito. Não poderia haver melhor palco para o Sargento. Não poderia haver melhor sinfonia para o Sargento. Aí é que ele se soltava, rajada para cima, cano incandescente de FAL na costa de um e de outro. Mas se aparecesse a Dina era capaz do dantesco e festivo Sargento Trajano fustigar suas próprias entranhas.
Todos eles querem falar, deixemo-nos, pois.
Passaram suas vidas com os lobos rondando seus telhados, humanidades e consciências. Um deles sente, por todos os malditos dias, o sangue de uma cabeça cortada percorrendo suas costas e seus caminhos e quer se libertar para resgatar toda uma vida que não foi e que nunca poderá ser se não disser o que sabe, o que viu, o que sente.
Parecem ter a altivez de compreender que só podem fazer isso se estiverem cerrando fileiras para localizar outros meninos que estão sepultados pela região do Araguaia. Neste caso ambos os meninos foram vitimas do mesmo algoz. É por isso que secretamente, naquelas noites sombrias da década de 1970 os meninos não-guerrilheiros levavam aos meninos-insurgentes, escondidos, cigarros ou comida. O Eduardo, guerrilheiro sobrevivente do Araguaia, não me deixa mentir.
Muitos irão se incomodar quando as vozes forem amplificadas.
O que me preocupa é que isso venha de setores que dizem defender a civilizatória causa do direito à memória e verdade. Para alguns, até o camponês que se viu obrigado a ser rastejador depois das mais bestiais torturas, se equivale ao General Hugo de Abreu. Aqui, a vitima se transforma em vilão e, os que verdadeiramente têm as mãos sujas de sangue aplaudem a confusão e vão se perpetuando na decrépita condição que a covardia enseja a suas velhices.
Espero que o que vamos escutar daqui para frente dos ex-soldados possa ajudar nas mentalidades daqueles que estão nos quartéis, de todos os seus generais, que a defesa da pátria é também de verdade histórica e tenham em Pery Beviláqua um belo exemplo à ser seguido.
E que não ousem os recalcitrantes de plantão tentar silenciar as vozes que se libertam porque até as mais diminutas pedras do Araguaia criarão ouvidos tal o ensurdecedor barulho que só a consciência avançada é capaz de produzir.
Espero que o que vamos escutar daqui para frente dos ex-soldados possa ajudar nas mentalidades daqueles que estão nos quartéis, de todos os seus generais, que a defesa da pátria é também de verdade histórica e tenham em Pery Beviláqua um belo exemplo à ser seguido.
E que não ousem os recalcitrantes de plantão tentar silenciar as vozes que se libertam porque até as mais diminutas pedras do Araguaia criarão ouvidos tal o ensurdecedor barulho que só a consciência avançada é capaz de produzir.
A Comissão Nacional da Verdade, de profunda dimensão democrática, cuja tarefa é proteger o futuro para uma nova geração de meninos só poderá exitar se revelar os punhais e as tramas dos lobos de 31 de Março de 1964.
Blog do Paulo Fonteles Filho: http://paulofontelesfilho.blogspot.com/
Foto: Carta Maior http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16353&editoria_id=5
Não recuaremos - Por Paulo Fonteles Filho
Seguimos sertões,
estradas de barro ou asfalto,
por grotas,
serras martirizadas
e certas histórias que não se apagam.
Corremos um sério risco
de não sermos mais quem somos
ou radicalizarmos
como necessidade para irmos adiante.
Passamos por rostos
em livros de sangue de toda uma época.
E certos rios ostentam pedras pretas
e são como um leme cortando caminhos.
Passamos por relatos
em casas camponesas onde a vida serpenteia atroz
em abandono, sem justiça ou escolas.
E um velho código faz saltar das mãos trêmulas,
um lamento.
É que há lobos sobre os telhados.
É que há coturnos antigos
e promessas de verdades silenciadas.
Não recuaremos.
Do Blog do Paulo Fonteles Filho: http://paulofontelesfilho.blogspot.com/2011/03/nao-recuaremos.html
Foto: Sebastião Salgado
A juventude inserida no contexto da violência urbana
A violência e a criminalidade, que se tornaram dos mais recorrentes problemas urbanos no atual período é mensurado em inúmeras pesquisas e estudos, que exploram principalmente as transformações urbanas que de alguma forma contribuem para a constituição do cenário da violência nos centros urbanos. Essas transformações concretizam as cidades como centros de consumo privilegiado, espaço de imposição de uma ideologia de felicidade graças ao consumo e ao urbanismo adaptado à centralização dos meios de poder, como a informação, formação, organização, operação e persuasão (Sánchez, 2003). Neste quadro, as redes sociais de suporte, como definiu Robert Castel, são desconstruídas ou fragilizadas, dando espaço para a constituição de vulnerabilidades sociais, que atingem os segmentos sociais mais marginalizados na sociedade, dentre os quais, podemos citar os jovens, um dos segmentos mais envolvidos pela crescente violência urbana.
A "reestruturação produtiva" da economia capitalista na sua atual fase está ligada à produção do espaço moldado às necessidades da acumulação. Na análise das sociedades urbanas, este amoldamento significa o aumento de fragmentos ou partes da cidade submetidos ao controle, normatização e privatização, de maneira que seu impacto atinja diretamente a vida social (Sánchez, 2003). Esses espaços capturados pelas relações de produção capitalista por meio da reestruturação urbana transformam-se de espaços com valor-de-uso para espaços com valor-de-troca, e destinam-se à produção (obras de infra-estrutura, de modernização tecnológica, dentre outras) ou ao consumo (turismo, lazer e consumo da cidade estimulados pela publicidade). Esta nova forma de acesso ao espaço mediada pelo mercado aprofunda a separação entre espaço público e espaço privado, acentua o processo de comercialização e especulação.
A nova ordem urbana pretende fazer impensáveis e impossíveis outras formas de viver na metrópole que sejam conflitivas com os parâmetros da cidade-mercadoria que busca consolidar. Tudo aquilo que não adere a essa dinâmica é interpretado como ingovernabilidade, como perturbação da ordem urbana que deve ser desalojada do panorama da modernização (Sánchez, 2001). Entretanto, a cidade nunca está totalmente tomada pelo poder do Estado midiático, processos constitutivos de sujeitos coletivos expressam maneiras de viver e reapropriações da cidade afastadas das previsões da ordem urbana promovida pela imagem oficial.
Na maioria das análises as representações são tornadas dominantes e cuidadosamente desenhadas para mostrar uma cidade homogênea e apagar as diferenças políticas, culturais, de classe ou de origem étnica presentes no território urbano. Deste fato surgem os discursos da cidade-pátria e do consenso-cidadão, da sociedade urbana como um bloco homogêneo sem conflitos de interesses, orientada para um grande objetivo comum, forjados no interior das políticas urbanas, com o apoio incondicional dos meios e o uso amplo de variados instrumentos publicitários que atuam como elementos importantes na regulação social e no controle político da população. Desta forma, a cidade-mercadoria, padronizada pelos mecanismos de regulação do capital, também padroniza sua atenção a uma população homogeneizada, que internamente apresenta uma série de contradições e conflitos. Desta forma, deixa de atender necessidades essenciais daqueles que não se enquadram no estereótipo de cidadãos da metrópole urbana. De acordo com Sánchez, o city marketing e a imposição de imagens urbanas tornadas dominantes contribui para o exercício da violência, especialmente em sua forma simbólica, pelas vias da comunicação e do conhecimento, violência nem sempre percebida por suas próprias vítimas e muitas vezes expressas de outras formas que não apenas a simbólica.
Quem mais sofreu com essa nova estruturação urbana foram os mais pobres, a população mais desfavorecida economicamente e com menos acesso às políticas sociais específicas e estruturais. Essa população foi cada vez mais realocada para as áreas periféricas dos centros urbanos, marcadas pela escassez de equipamentos públicos que pudessem atender as suas necessidades básicas. E esse ato aproxima ainda mais essa população das diversas formas de violência, desde a violência caracterizada pela negação dos direitos básicos dessa população, seja pela violência física, engendrada a partir de vários fatores resultantes desse modo de vida e das experiências pelas quais são obrigados a passar. É neste cenário que este artigo busca localizar os jovens contemporâneos, que vivem a fase da vida de definições e tomadas de decisão, e também, a constante tensão entre a busca de sua emancipação pessoal e a subordinação as regras de convivência da sociedade de consumo, principalmente os jovens urbanos que vivem no modelo de "cidade-mercadoria".
O city marketing influencia também a socialização dos jovens. O seu imaginário está impregnado por informações e imagens de juventude veiculadas pelos meios de comunicação de massa, que tantas vezes repetidas incorporam-se na percepção que esses jovens constroem de si próprios e do mundo. Dessa forma são assimiladas muitas das aspirações de consumo e estilos de vida estimulados por essa hegemonização transmitida pela mídia.
No mundo contemporâneo, a violência tem se tornado um fenômeno, que em casos mais extremos, fere o mais fundamental dos direitos humanos, o direito à vida, o que amplia a sua incidência e dificulta ainda mais sua compreensão. Além disso, tem se tornado cada vez mais abrangente e atingido todas as classes sociais, gêneros e gerações, ultrapassando diferenças geográficas, étnicas e políticas. A forma como atinge determinados grupos pode assumir contornos de singularidade, ou porque alguns tipos de violências são mais recorrentes a indivíduos de determinada identidade, ou porque se constituem a partir das relações que se constroem socialmente pelo exercício das relações sociais de classe, gênero, geração e etnia, por exemplo. Desta forma, o conceito de violência deve ser considerado na sua forma mais ampla, não ficando restrito aos danos físicos que podem levar à morte, mas também, o conjunto de restrições que impedem o gozo dos direitos essenciais. Por isso fatores como exclusão social, discriminação racial, violência verbal devem ter a mesma atenção que a violência física.
É, portanto necessário ampliar e refletir sobre o conceito de violência, levando em conta as várias manifestações sobre a questão, seus atores, suas vítimas, seus discursos, presumindo que a violência além de destruir fisicamente, ela devasta moralmente, mexendo com a subjetividade dos envolvidos.
Os fatores relacionados aos atos de violência atualmente ganharam contorno de uma multiplicidade, as causas estão relacionadas a diversas outras, não podem ser isoladas. Por conta deste fator, existe uma dificuldade em estabelecer relações de causalidade, principalmente quando se observa a pulverização da violência, sua banalização e sua inserção no cotidiano dos indivíduos em geral. Dentro desta realidade, a concentração da riqueza e a dificuldade de inserção remunerada no mundo do trabalho dificultam o acesso desse jovem à renda e, para a maioria dos jovens, a realização das suas aspirações incorporadas. A contradição e o choque que surgem entre os horizontes propostos pela mídia e as limitações concretas da vida real, entre elas a dificuldade de obtenção de renda, condições sociais precárias, inexistência de políticas públicas satisfatórias que promovam a inserção juvenil e possibilidades reais de construção de identidade individual e coletiva, se posicionam entre os fatores básicos que possibilitam uma explicação dos crescentes riscos de envolvimento com o narcotráfico e com outras formas de violência e criminalidade.
Nesse ciclo é notória a vulnerabilidade que alguns jovens se encontram, de forma que passam a ocupar o imaginário social na condição de vítima e de vitimizador. Os instrumentos existentes de mediação e cultura são poucos e não dão conta das demandas de atendimento aos jovens. Essa situação contribui para a construção da vulnerabilidade desse segmento diante da ação de criminosos, que acabam por buscar ajuda no crime organizado para garantir o sustento da família e de si; tornam-se os "soldados", "aviões", em busca de renda e de reconhecimento social (Projeto Juventude, 2004). A violência atinge a juventude também a medida que se fortalece o cenário e reforça-se o imaginário coletivo de que todo jovem pobre, morador dos espaços de exclusão é potencialmente vítima ou promotor de violência. Inúmeros dados têm comprovado que esses jovens, os que moram nas áreas mais periféricas, encontram-se em situação de ainda mais vulnerabilidade à violência e constituem uma das principais causas de morte de adolescentes e jovens.
"Segundo Waiselfisz (2007), a estrutura de mortalidade
é notadamente diferenciada entre os jovens e os
não-jovens. Enquanto as causas naturais (doenças) são
responsáveis por 27,2% das mortes entre os jovens, no
grupo não-jovem representam mais de 90,2% das causas
de mortalidade. Já as causas externas, que na população
não-jovem responsáveis por 9,8% dos óbitos,
são responsáveis por 72,8% da mortalidade entre os
jovens. Essas causas externas englobam acidentes de
transporte, homicídios e suicídios, sendo que estes
últimos, de forma isolada, são responsáveis por mais
de 61,3% das mortes dos nossos jovens."
(LOPES, Sueli. ADORNO, Rubens de C. F. , 2008)
A esse imaginário coletivo que estereotipa os jovens das áreas mais periféricas com potencialidades de criminosos, junta-se outro, o de "correção" por meio do castigo, através do qual se legitima o uso da violência até mesmo em equipamentos socialmente criados para atendimento dessa população, como a escola, por exemplo. Essas práticas de violência socialmente produzidas e culturalmente aceitáveis violam cotidianamente os diretos sociais básicos dos jovens e instituem um viés de classe estabelecido a partir do parâmetro entre periculosidade e classe social, constituindo a cultura que estigmatiza essa população. Para amplos setores da sociedade e da mídia, as políticas públicas para a população que vive a condição juvenil, ou seja, os indivíduos com idade entre 15 e 29 anos, devem ser construídas com a perspectiva de controle, seja através da repressão direta, como por exemplo o Toque de Recolher (medida implantada recentemente em algumas cidades brasileiras) ou buscando mantê-los "ocupados", utilizando-se de uma lógica alienante e repressora, pois desconsidera os direitos dos jovens à cultura, ao lazer, ao esporte e ao tempo livre.
Esses mecanismos afastam a juventude da busca e construção de soluções positivas para o enfretamento dessa realidade. Daí surge a necessidade de pensar em uma política pública que considere esses jovens como protagonistas, com capacidades múltiplas de intervenção na sociedade. E as políticas voltadas para a prevenção das violências devem ser inseridas no marco da inclusão e da universalização dos direitos, implementando-as sem medidas de controle repressivo, e com iniciativas de promoção e garantia de direitos.
Portanto, diante da análise de como se constituem as novas cidades a partir das reestruturações urbanas, as exigências que esse novo modelo estabelece para sua inserção permite não apenas a exclusão de parcela da população que não se enquadra aos modelos impostos e dominantes, como possibilita a construção de mecanismos que violem os direitos básicos e humanos. E os jovens estão entre os segmentos que mais são atingidos por essas reestruturações. O que evidencia a necessidade de construção e o fortalecimento das políticas públicas que encarem o jovem como sujeito com capacidades e que promovam a sua inclusão na sociedade e a sua emancipação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Projeto Juventude, Instituto Cidadania, 2004.
ABRAMOVAY, Miriam. Juventude, violência e vulnerabilidade social na América Latina: desafios para políticas públicas. UNESCO, BID. 2002.
SÁNCHEZ, Fernanda. A reinvenção das cidades para um mercado mundial. Chapecó: Argos, 2003. Pag. 39 a 144.
MITSCHEN, Tomas.Crescimento, pobreza e violência em Belém. NUMA e POEMA/UFPA. 2006.
NJAINE, Kathie. MINAYO, Maria Cecília de Souza. Violência na escola: identificando pistas para a prevenção. In: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S141432832003000200009&script=sci_arttext&tlng=pt (19/12/2009 – 2h28)
ABRAMOVAY, Miriam."A Violência Urbana e seus Reflexos na Escola".
LOPES, Sueli. ADORNO, Rubens de C. F. , Juventude, Pobreza e Violência, São Paulo: 2008.
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