24 de novembro de 2011

Ousar ter esperança



Morrer ajoelhado com tiros na cabeça. Morte dura, cruel. E eram apenas jovens. Seis, com idade entre 14 e 17 anos, assassinados em Icoaraci, distrito de Belém, na calçada, em frente a um prédio de instituição pública municipal. Indícios claro de execução.
Hoje, em um jornal regional no horário do almoço, a apresentadora em conversa com o atual secretário de segurança pública do estado do Pará, cogitou com este se o crime poderia ser passional. Nas primeiras informações sobre o crime, a policia chegou a alegar que alguns dos jovens assassinados tinha registro de passagem pela policia.
Declarações que não deixam dúvidas sobre como se trata vitimas de violência em nosso estado e no país. Não basta ser violentado por ser pobre, jovem, negro, morador de área periférica, já ter boa parte de seus direitos usurpados. Não basta ser morto cruelmente ajoelhado e com tiro na cabeça. Você ainda é desrespeitado mesmo após a morte brutal. Ainda tentam justificar o crime, diminuí-lo.
Sou cidadã, pesquisadora da área de crime e criminalidade. Mas não embruteci. Fico chocada com esses tipos de violência. Chocada com a insensibilidade de gestores públicos e de parcela da imprensa.
Nesta situação, eu realmente gostaria de ouvir do secretário de segurança do Pará: o Estado falhou novamente, não demos conta mais uma vez de garantir o direito de viver de mais 6 jovens, de protegê-los, de lhes permitir que vivessem sua vida, realizassem seus sonhos. Jovens, famílias, sociedade paraense, pedimos desculpas e prometemos nos empenhar para impedir que novas mortes aconteçam.
Não queria mais ouvir, por parte da imprensa e da policia, tentativas infundadas, injustificadas e desrespeitosas, cogitando crime passional, alegando passagem de alguns dos jovens pela policia como possível justificativa para o ato bárbaro. Ouvi essas declarações e me senti no século XVII, antes da reforma penal, quando as punições por crimes eram centradas no suplicio do corpo. Ainda é está mentalidade que paira em partes da nossa policia e da nossa imprensa. Matou? Pode ser morto. Roubou? Pode apodrecer na cadeia.

Nas declarações do secretário hoje, ouvi indiferença. Não queria e não aguento mais ouvir, numa hora dessas, que os índices de criminalidade e de homicídio no Pará tem diminuído nesta gestão governamental. Se for verdade essa diminuição, não impede e não impediu que a vida de jovens seja tirada brutalmente, que a alma dos pais e mães seja arrancada, trucidada.

Gestor público tem que ter sensibilidade, não basta eficiência com dados, informações. Gestam vidas e não números, como dizia o próprio senhor governador a época de sua campanha ao governo. E que parece ter esquecido.
Não foi dado tom respeitoso por parte da tal apresentadora do jornal. Não é possível que assassinato de seis jovens, ajoelhados e com tiros na cabeça seja considerado como crime passional.
De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, dados sobre o registro de crimes no País em 2010 e o investimento dos Estados na segurança apontam que nossa situação no Pará é realmente séria.
Estamos na 6ª colocação do ranking de estados em número de homicídios dolosos, ou seja, causar a morte de alguém, com uma taxa de 33,2 homicídios por 100 mil habitantes; e também em crimes violentos letais (homicídio doloso, latrocínio e lesão corporal seguida de morte). Somos o 2º estado no ranking de latrocínios, roubo seguido de morte. Ocupamos a 8ª colocação no ranking de tráfico de entorpecentes. E de posse ilegal de armas. O 9º estado em casos de estupro, atos libidinosos e atentados violentos ao pudor. O 11º em lesão corporal dolosa. Em contrapartida aos que taxam os/as jovens de perigosos, somos, de acordo com está pesquisa, o 23º estado em criminalidade juvenil (adolescentes “em conflito com a lei” e com liberdade restringida).
Para esta situação preocupante, para me utilizar de um pleonasmo, o governo estadual disponibiliza apenas R$ 136,00 por pessoa nos gastos com segurança pública, fazendo com que o Pará seja o 22º estado em gastos no país com esta área.
Lembro que na campanha ao governo estadual, o atual governador gostava de repetir quase como um mantra a idéia de que se preocupava mais com pessoas do que com números.
Não acreditei nisso à época. Não acredito agora. Seis jovens foram brutalmente assassinados. Os números comprovam que a situação da segurança pública no Pará são caóticos. Fico com a certeza de que o atual governo estadual não se preocupa nem com os números, e muito menos com a população do estado.
Continua permitindo a morte de nossos jovens. A morte física, brutal. E a morte lenta, aquela que vai matando aos poucos, quase de maneira imperceptível, destruindo sonhos, impedindo de estudar, de trabalhar decentemente, de se divertir.
Eu ouso ter esperança num estado marcado pelo derrame de sangue de nosso povo.

3 de novembro de 2011

Vivo




Não ter medo da vida deveria ser um princípio. Desses que não abrimos mão, nem em momentos que estamos postos em teste.

Encarar a vida de frente, sem a presunção de quem quer domá-la por puro egoísmo, mas sim, de peito aberto, de quem quer respirar os ares da felicidade e da liberdade.

Obviamente, não sou eu a pessoa a afirmar que nunca tive medo de encarar a vida. Certos sentimentos nos dominam as vezes, de tal forma, que se torna impossível se opor a eles.

O que posso afirmar, é que nunca tive medo de me dar ao luxo (nem tenho certeza se posso afirmar ser isso um luxo) de viver a vida, com tudo o que ela me oferecia de bom e de ruim, ou melhor dizendo, com tudo o que ela me oferecia para que eu pudesse construir de bom e de ruim.

Devo confessar, é necessário, que tantas vezes fui teimosa ao extremo, exagerada desmedidamente, orgulhosa em excesso. E em cada uma dessas situações construí pontes que me levavam a caminhos de aprendizado e até de felicidade.

Construo caminhos todos os dias.

Em cada momento.

Num olhar, numa palavra, num gesto.

Que me levem a lugares desconhecidos, ou até mesmo aos conhecidos que nunca ousei seguir.

Tantas vezes chorei, recuei, driblei vontades. Não me arrependo. Aprendi.

A vida segue. 

Respirar deve ser um desses aprendizados que não devemos abrir mão.

Respirar e encher os pulmões de vida. 

Seguir os impulsos do coração; dar ouvidos à razão, mas guiar-se apenas por ela jamais.

Os desafios vem, ensinam, passam. 

Fico. Eu e o caminho que construo.